Introdução: Um sacrifício público para uma salvação pública
O cristianismo não é uma religião que se fecha entre quatro paredes da nossa casa, mas um convite a ser luz para o mundo. Jesus Cristo não morreu em segredo ou escondido, mas em público, diante dos olhos de todos: autoridades judaicas, soldados romanos, gente simples e até zombadores que estavam aos pés da cruz. O seu sacrifício não aconteceu na sombra, mas no Gólgota, um lugar elevado como um palco sobre a colina, para que todos pudessem ver que o Filho de Deus dava a vida pela salvação do mundo.
«Quando chegaram ao lugar chamado Caveira, ali o crucificaram, a ele e aos malfeitores, um à direita e outro à esquerda» (Lc 23,33).
Este fato tem uma enorme relevância teológica: Cristo morre por todos os homens, por cada nação, por cada pecador. E ele o faz não só para nos redimir pessoalmente, mas para transformar o mundo através de um testemunho público. Por isso a fé não pode ser reduzida a uma experiência íntima e privada, mas deve ser vivida, partilhada e testemunhada.
1. A publicidade da Cruz à luz da história da salvação
Desde o início, Deus se revela em público. Ele escolhe Israel para ser o seu povo diante de todas as nações, e dá a sua Lei no Sinai em meio a trovões e fogo. Os profetas proclamam a sua palavra não em segredo, mas nas ruas, nas praças, às portas da cidade. A obra de Jesus continua esta dinâmica: ele prega nas sinagogas, nos campos, junto ao lago, nos templos e nas casas. A sua vida é um anúncio constante e público da verdade.
O ponto culminante desta revelação acontece na cruz. Ela é o “livro aberto” que todos podem ler: um rei que morre humilhado para salvar o seu povo. São Paulo o destaca: «Nós, porém, anunciamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos» (1 Cor 1,23). Cristo não se escondeu, e justamente por isso o seu sacrifício alcança a todos.
Se Deus age em público, por que deveríamos relegá-lo à nossa esfera privada? O Evangelho é destinado à vida, à história, à sociedade, à cultura – a tudo o que nos rodeia.
2. Uma teologia da publicidade: a fé cristã é visível
Na teologia entendemos que a salvação não é uma simples “experiência interior”. Os sacramentos são sinais visíveis, celebrados em público, porque constroem comunidade. A Eucaristia, por exemplo, não é algo que cada um celebra secretamente, mas a assembleia do Povo de Deus.
A própria Igreja é «sacramento de salvação» (Lumen gentium, 1): um sinal visível, uma cidade sobre o monte que não pode ficar escondida (cf. Mt 5,14). Ser cristão significa, portanto, viver publicamente, não para vanglória, mas para tornar Cristo visível.
A publicidade da fé não é arrogância, mas coragem. Coragem de dizer, num mundo que frequentemente relega a religião ao privado: «Eu pertenço a Cristo e não me envergonho disso». São Paulo confirma: «Pois não me envergonho do Evangelho, porque ele é a força de Deus para a salvação de todo aquele que crê» (Rm 1,16).
3. A tentação de privatizar a fé
Hoje ouvimos com frequência: «A fé é uma questão privada». E é verdade que a relação pessoal com Deus é única e íntima. Mas o erro está em pensar que essa relação não deve ter consequências públicas.
A sociedade moderna procura confinar a religião ao âmbito privado, como se não tivesse lugar na cultura, nas leis, nos debates sociais ou na vida cotidiana. No entanto, se seguimos Cristo, não podemos impor-lhe que toque apenas o nosso coração sem influenciar as nossas ações, as nossas palavras e as nossas escolhas.
Se relegamos Cristo ao privado, traímos o caráter público do seu sacrifício. Tornamo-lo invisível num mundo que precisa dele mais do que nunca. A fé que não é testemunhada morre lentamente na indiferença.
4. Aplicações práticas: viver a fé publicamente hoje
Como podemos colocar esta mensagem em prática na vida cotidiana?
- Na família: viver a fé juntos, rezar antes das refeições, transmitir aos filhos os valores cristãos, não esconder a cruz, mas colocá-la de forma visível no lar.
- No trabalho: agir com honestidade, justiça e caridade. Não se calar quando a verdade é distorcida. Ser coerente com o Evangelho, com coragem e respeito.
- Na sociedade: não ter medo de participar em manifestações públicas de fé, procissões, festas ou ações de caridade. Mostrar com alegria e sem complexos a própria identidade católica.
- Nas redes sociais: partilhar a fé também no espaço digital. Hoje as redes são um novo areópago onde podemos tornar o Evangelho visível com testemunhos, reflexões, orações e obras.
A publicidade da fé não é imposição, mas luz que orienta. O próprio Jesus disse: «Não se acende uma lâmpada para colocá-la debaixo do alqueire, mas no candeeiro, e assim ilumina a todos os que estão em casa» (Mt 5,15).
5. Pastoral: a coragem de ser católico sem complexos
Um cristão de hoje precisa de coragem. Não a coragem da guerra, mas a da testemunha. Uma coragem que nasce do amor. O cristão corajoso não é fanático, mas alguém que não tem medo de amar publicamente.
A pastoral da Igreja convida-nos a viver a fé com alegria, não apenas por obrigação. Os discípulos missionários não são discípulos escondidos, mas homens e mulheres que tornam visível o fogo de Cristo.
O Papa Francisco recordou na Evangelii gaudium que a alegria do Evangelho é destinada a todos os homens, e que «não pode haver uma nova evangelização se não for aberta e pública».
A cruz é uma cátedra pública. Nós somos os seus alunos, e o mundo é a sala onde aprendemos.
Conclusão: A tua vida, continuação do sacrifício público de Cristo
Cristo morreu por ti – e não o fez em lugar escondido, mas diante dos olhos de todos. O seu sangue correu pelas ruas de Jerusalém, diante dos soldados e do povo, para que ninguém pudesse dizer que não viu.
A tua vida de cristão é continuação desta dimensão pública: no teu trabalho, na tua família, na tua cultura, no teu povo. Não relegues Cristo à tua intimidade privada, mas torna-o presente na história.
Se recordares que Cristo morreu em público, compreenderás que a tua fé deve ser vivida de modo visível. Não para te exaltar, mas para exaltá-lo. Não para te mostrares, mas para mostrar que Ele vive.
«Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus» (Mt 5,16).